terça-feira, 29 de julho de 2014

SOBRE O FILÓSOFO DJACIR MENEZES


Epitácio Rodrigues

    Nos cursos de graduação e nas aulas ministradas no Ensino Médio pouco se fala a respeito dos filósofos brasileiros e de suas contribuições para a consolidação de uma produção filosófica entre-nós. Nesse sentido, este texto pretende ser uma apresentação, ainda que muito insipiente, do filósofo Djacir Menezes, um pensador brasileiro cuja produção intelectual trouxe significativos contributos à reflexão filosófica, sociológica, econômica e jurídica. Existem muitos filósofos que merecem ser conhecidos por nós, mas por razões bem pessoais resolvi começar por esse.
    O meu primeiro contato com um livro de Djacir Menezes se deu casualmente, quando li Nordeste de Gilberto Freyre. Ali o autor fazia referência a um outro texto sobre o mesmo tema, mas com outra abordagem. Era o livro O Outro Nordeste, de Djacir Menezes. Depois de muito esforço, consegui encontrar um exemplar do referido livro e a leitura da obra despertou em mim a curiosidade para saber mais respeito do autor e da sua bibliografia. Depois de alguns meses de pesquisa, resolvi apresentar essa breve apresentação biográfica que espero completá-la com algumas considerações a respeito da produção filosófica de Djacir Menezes num futuro próximo.

 1. Quem foi Djacir Menezes? 
    Djacir de Lima Menezes nasceu na cidade de Maranguape, no estado do Ceará, no dia 16 de novembro de 1907, filho de Paulo Elpídio de Menezes e Olga Freire de Lima Menezes. Seu pai, nascido na Pequena cidade do Crato, bacharelou-se em Direito e tornou-se depois jornalista, dirigindo três jornais. É autor do livro O Crato do meu Tempo. Seu filho seguiu caminho parecido – escrever e dirigir instituições -, mas com uma estrada mais longa e complexa.
      A formação escolar de Djacir Menezes teve início no Instituto Miguel Borges do professor Odorico Castelo Branco, onde cursou o primário, corresponde ao que chamamos hoje de Ensino Fundamental, e o Ensino Secundário (atual Ensino Médio) no Liceu do Ceará, mesmo lugar onde, anos antes havia estudado o também filósofo cearense Farias Brito.
      Em 1926 iniciou a graduação em Direito na Faculdade de Direito do Ceará. Porém, três anos depois, transferiu-se para a Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, onde se diplomou em 1930. De volta ao Ceará, na faculdade onde havia iniciado sua graduação, concluiu o curso de Doutoramento em Direito, em 1932, com a tese: “Kant e a idéia de direito”. Essa tese abriu as portas para o seu ingresso como professor nessa instituição, ministrando a cadeira de Introdução à Ciência do Direito. Em 1938 fundou a Faculdade de Ciências Econômicas do Ceará, da qual foi o primeiro diretor, posteriormente incorporada à Universidade Federal do Ceará (UFC). Dois anos mais tarde, foi aprovado em dois concursos: um para a Faculdade de Filosofia e o outro para a de Economia, ambos da Universidade do Brasil (atualmente Universidade Federal do Rio de Janeiro). Com a aprovação no concurso, mudou-se em definitivo para a capital da Republica, Rio de Janeiro, em 1941, onde assumiu o cargo de professor catedrático da Faculdade de Economia, ministrando a disciplina Historia e Doutrinas Econômicas. Nessa Universidade, além de professor, foi também reitor nos anos de 1969 a 1973. Após o mandato, tornou-se professor emérito dessa mesma Instituição universitária. Foi diretor do Centro de Estudos Brasileiros em Buenos Aires, entre os anos de 1953 a 1954; e do Instituto Brasil-Bolívia, em La Paz, no ano de 1958. Também ministrou a cátedra de Literatura Brasileira na Universidade Autônoma do México, em 1959. Além de membro da Academia Brasileira de Ciências Econômicas e Administrativas, era sócio efetivo do Instituto Histórico, Geográfico e Antropológico do Ceará. 

2. Vinculações e principais obras
   Djacir Menezes faleceu em 1996, no Rio de Janeiro, deixando uma vasta produção intelectual. No que se refere à produção filosófica, os organizadores do livro As idéias filosóficas no Brasil (Crippa, 1978) apresentam Djacir Menezes como um filósofo do direito ao lado de Francisco Campos, Eusébio de Queirós Lima, Ponte de Miranda e Pinto Ferreira, dentre outros (Cf. SEVERINO, 2008, p.29). Luckesi e Passos na sua Introdução à Filosofia (Cortez, 1985), falam de uma vinculação de Djacir Menezes com o positivismo nos seguintes termos: “Euryalo Canabrava, em oposição a esse culturalismo em desenvolvimento, assume uma posição neopositivista, assim como Leônidas Hegenberg e Djacir Menezes” (2004, p. 266). Essa colocação é mais explicitamente esclarecida por Lima Vaz, no texto O pensamento filosófico no Brasil de hoje, escrito como apêndice acrescentado ao livro de Leonel Franca Noções de História da Filosofia. Lima Vaz afirma que a primeira fase do pensamento de Djacir Menezes e Euryalo Canabrava se configurou como uma reflexão sobre a ciência, vinculada à tradição positivista (cf.SEVERINO, 2008, p. 31).
      Para Severino, Djacir Menezes é um dos jusfilósofos brasileiros ligados ao culturalismo, cujas origens no país remontam ao filosofo Tobias Barreto e a Escola de Recife, só que no caso de Djacir com acento hegeliano. Comentando sobre o filósofo, afirma Severino: “A cultura é a via de acesso à realidade ontológica e, por ela, na opinião de Menezes (1977, p. 93), o homem, ser espiritualizado, está promovendo uma luta contra a própria naturalização (2008, p. 151).
      Como já mencionamos acima, Djacir Menezes deixou uma vasta obra sobre Literatura, Filosofia, Sociologia, Direito e Economia, dentre as quais: O problema da Realidade objetiva (1932); Diretrizes da Educação Nacional (1932); Teoria Científica do Direito (1934), Pedagogia (1935), Dicionário Psico-Pedagógico (1935), O Outro Nordeste (1937), Psicologia (1940), Princípios de Sociologia (1944), Curso de Economia Política (1947), Crítica Social de Eça de Queirós (1950), As Elites Agressivas (1953), A.B.C. da Economia (1953), Evolução do Pensamento Literário no Brasil (1954), Raízes Pré-socráticas do Pensamento Atual (1958), A querela Anti-hegel (1960), Temas de Política e Filosofia (1962), Evolucionismo e Positivismo na Crítica de Farias Brito (1962), Mondolfo e as interrogações de nosso tempo (1963), Introdução à Ciência do Direito (1964), Proudhon, Hegel e a Dialética (1966), Textos Dialéticos de Hegel (1969), José Ingenieiros e minha formação (1970), Ideias contra ideologias (1971), Teses quase hegelianas (1972), Motivos alemães (1976), Premissas do culturalismo dialético (1979), O Brasil no Pensamento Brasileiro (livro organizado por ele para o Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais, subordinado ao INEP). Além de livros, Djacir deixou uma gama de artigos Publicados em revistas especializadas, como a REB e também muitos artigos publicados em jornais.
     Djacir Menezes é reconhecido como um pensador ligado o culturalismo, como forte influência de Hegel, e que escreveu sobre a Filosofia, o Direito, a Sociologia e Economia. Seu pensamento, apesar de ser ainda pouco conhecido em muitos centros acadêmicos, existem trabalhos de analise e discussão de seu pensamento, dentre elas o livro de Paupério, A. M. Djacir Menezes e as perspectivas do pensamento contemporâneo

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
MENEZES, Eduardo Diatahy Bezerra de. O Pensamento Brasileiro de Clássicos Cearenses. Volume II. Fortaleza: Instituto Albanisa Sarasate, 2006.
LUCKESI, Cipriano Carlos & PASSOS, Elizete Silva. Introdução à Filosofia: aprendendo a pensar. 5ª Ed. São Paulo: Cortez, 2004. 
SEVERINO, Antonio Joaquim. A Filosofia contemporânea no Brasil: conhecimento, política e educação. 5ª ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2008.




domingo, 6 de julho de 2014

PENSANDO O RESPEITO ENQUANTO VALOR FUNDAMENTAL DO SER HUMANO


Epitácio Rodrigues

Desde o nosso nascimento, somos lançados em um mundo de coisas, seres, crenças, valores e costumes que interferem diretamente na construção do nosso entendimento da realidade, por isso não vivemos simplesmente, mas con-vivemos, na medida em somos impelidos a partilhar um complexo de vivências intersubjetivas. Cada um de nós é o resultado desses encontros e vivências e o significado que lhes atribuímos, pois ao partilharmos a existência com outras pessoas, somos afetados por essa teia de valores e entendimentos, mas não assimilados passivamente por nós, pois fazemos uma síntese muito pessoal, tornando o meu entendimento do mundo sempre diferente dos demais com os quais interajo.
O contato interpessoal põe em evidência as diferenças e, não raro, ocasiona conflitos de interesses, de desejos e de projetos de vida. Se não podemos viver sozinhos, fica a indagação de como devemos lidar com as diferenças? Se por um lado, não é possível vivermos na solidão, no máximo momentos de isolamento físico, já que o ser-com-os-outros é parte da nossa constituição fundamental, também não podemos obrigar os outros a se tornarem iguais a nós à Procusto. Resta-nos apenas aprender a con-viver com mais excelência. Isso significa que se a sociabilidade faz parte da nossa constituição, a socialização saudável é fruto de um aprendizado, é resultado de uma pedagogia da con-vivência. Mas, interagir de modo significativo com outras pessoas supõe a decisão de cultivar alguns valores indispensáveis, dente eles, o respeito. Estamos acostumados a pensar o respeito como sinônimo de temor em relação a alguém, mas conforme lembram Aranha e Pires, a palavra respeito deriva do latim respicere, cujo significado básico é “olhar para”. Assim, respeito indica, no sentido mais preciso, a capacidade de ver a pessoa como ela é, reconhecendo-a na sua individualidade singular (1993, p. 321). Respeito, portanto, é ver o outro como outro.
Ver uma pessoa na sua alteridade não é muito fácil, pois normalmente reduzimos as pessoas ao que pensamos ou imaginamos dela e não percebemos que uma coisa é o que pensamos dele e outra bem diferente o que ele é de fato. Para ver as pessoas como são a primeira exigência é nos darmos conta de que o outro, no sentido mais preciso, nos escapa. Mas então, como evitar ou ao menos minorar uma compreensão equivocada do outro pela nossa inteligência? A resposta é simples: “ver” e “ouvir” o outro. A orientação pode parecer simplória, mas às vezes, o fundamental é o mais óbvio, o que não significa que seja o mais fácil.  Ver e ouvir são exigências inerentes ao conceito de pessoa humana. De fato, a origem da palavra pessoa, na tradição latina deriva de persona, que por sua vez traduz a palavra grega prosopon (mascara/face). Prosopon “é originariamente formado de duas outras palavras: pros, 'em direção de' e ops, 'olho', e o seu sentido mais preciso é: 'aquilo que atrai o olhar'” (RODRIGUES, 2013, p. 45). A palavra tem, portanto, uma ligação intrínseca com a experiência do olhar. Eu reconheço o outro voltando o meu olhar atento para ele, com o propósito de vê-lo como ele é. Não podemos esquecer o aspecto dialético da experiência: revelação – indicado pelo rosto – e o velamento sugerido pela máscara. Outro é revelação e mistério. O respeito é ver o outro como pessoa: alguém que mostra que o ser é transfenomenal, ou seja, ultrapassa o que o meu olhar capta. Mas prosopon tem também uma relação com a comunicação. Algo que é mais bem elucidado pela tradução latina, persona (de per- para; sonare – soar): literalmente “para soar mais perfeitamente”. O prosopon ou persona era originariamente uma mascara teatral que servia para caracterizar o rosto e a identidade do ator, se trágico ou cômico, mas também para ampliar o som da sua voz, tornando-a audível e compreensível pelo auditório. Assim, ouvir o falar do outro, como uma forma de revelação de si. Diálogo (diá- entre; logos – palavra, ideia, conceito) significa o processo de interação no qual uma palavra/logos se coloca entre dois. É através do diálogo, no face-a-face, que o outro se revela a nós como outro. Assim, é pela escuta do outro como outro, no face-a-face da proximidade, que ele se mostra como fenômeno e transfenomenal.

Referência bibliográfica:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda & PIRES, Maria Helena Martins. Filosofando. 2ª ed. rev. e atual. São Paulo: Moderna, 1993.
COMTE-SPONVILLE, André. Dicionário Filosófico. São Paulo: wmfmartinsfontes, 2011.
DUSSEL, Enrique. Ética Comunitária. Petrópolis, RJ: Vozes, 1986.
RODRIGUES, Epitácio. Do Ninguém à Pessoa. In: RODRIGUES, Epitácio & CARVALHO, Elieldo Duarte. As Portas do Tempo nos Muros da Vida. Juazeiro do Norte-CE: 2013.


segunda-feira, 26 de maio de 2014

CONHECE-TE A TI MESMO

Epitácio Rodrigues

Que somos nós? De onde viemos? Para onde vamos? Qual o sentido da nossa existência? O que significa viver? Qual o valor da vida frente à eminência da morte? Essas são questões que acompanham o ser humano desde o momento em ele que tomou consciência do seu ser-no-mundo. Como as repostas nem sempre são simples, não raro tendemos a escolher o caminho mais curto e mais fácil a ser trilhado. Nesse sentido, tornou-se famoso, desde a antiguidade, o adágio:comamos e bebamos porque amanhã morreremos(Cf. Is. 22,13; ICor. 15,33 ). Essa apologia do prazer imediato e descomprometido com o futuro como um projeto de vida feliz tende a acarretar uma frustração pela própria natureza do prazer como algo fugaz e provisório, exigindo uma inventividade e superação constante. O prazer experimentado ontem deve ser mais intenso hoje ou então será mera rotina: a cada vez deve ser mais intenso, mais fantástico sob o risco de deixar de ser prazer. Para usar uma metáfora socrática, é uma espécie de tonel furado, quando mais se tenta enchê-lo mais vazio lhe parece.
Outra fuga da vida é a adoção de um projeto de felicidade entendido como um esforço para não passar privações, no qual cada dia é entendido como momento de preparar e garantir a subsistência e prazeres futuros. A felicidade passa a ser entendida sempre a partir de uma ótica negativa, equivalendo a um evitar sofrimento. Nesse projeto, nos casos mais radicais, qualquer manifestação de alegria é suprimida. Um exemplo disso pode ser ilustrado com a prática monástica, que sob o pretexto do ora et labora (ora e trabalha), condenavam o riso: “o riso é abundante na boca dos estultos.”
A sintomatologia do homem e mulher hodiernos, de modo especial os mais jovens, mostra uma dificuldade em sabem lidar com essas duas realidades humanas, cuja administração é condição sem a qual não para uma vida equilibrada, a saber: o sofrimento e o prazer. Isso Por que o homem ocidental, por uma série de razões, não foi adequadamente educado para lidar com o prazer e com o sofrimento. O filósofo Aristóteles já mostrava uma preocupação a esse respeito, quando lembrou que a excelência das nossas ações estava relacionada com o prazer e o sofrimento, e acrescentou: “É por causa do prazer que praticamos más ações, e por causa do sofrimento que deixamos de praticar ações nobres. Por isso, como diz Platão, deveríamos ser educados desde a infância de maneira a nos deleitarmos e sofremos com as coisas certas; assim, deve ser a educação correta” ( 2002: p. 43).
A ausência de uma educação ou de uma formação que contemple isso se torna evidente na falta de parâmetros racionais e consistentes para avaliar e valorar, seja as experiências de sofrimento, seja as de prazer. Somos, frequentemente, incapazes de extrair de ambas alguma aprendizado que nos torne um ser humano melhor e mais preparado para a própria vida. A consequência disso é que as nossas experiências de prazer e também as de sofrimento, não raro, nos conduzem ao mesmo ponto: a infelicidade.
O filósofo Sócrates dedicou parte de sua vida a exortar o ser humano ao autoconhecimento em busca de uma vida feliz. Ele acreditava que o ser humano é essencialmente a sua psique/alma, ou seja, a razão enquanto sede da atividade pensante e eticamente operante.[1] Por isso, esse filósofo assumiu como sua missão nas andanças que realizava convencer aos jovens e velhos de que o foco do cuidado humano devia estar voltado à alma e não tanto ao corpo e às riquezas e demais coisas exteriores. O corpo, segundo ele, era apenas um instrumento do qual se servia a psique/alma, então quando afirmava repetidas vezes: “conhece-te a ti mesmo”, ele estava exortando cada pessoa um mergulho na sua interioridade, pois, como deixa muito claro na Apologia “a vida sem exame não é digna de ser vivida”.
A expressão “conhece-te a ti mesmo” não é de autoria do filósofo, mas uma das máximas que se encontravam no frontispício do tempo de Apolo, em Delfos. O mesmo templo no qual seu amigo e discípulo Querofonte, indaga à sacerdotisa a respeito de quem era o homem mais sábio, ao qual ele responde: “Sócrates!” Convicto da necessidade do autoconhecimento, Sócrates apropria-se da máxima para deixar claro o seu projeto. Dainezi, comentando a frase, esclarece: “é a vida que dispõe do olhar para si, do exame das atitudes, das ações, do constante duvidar, da constante busca do bem” [2].
O velho Sócrates provocou uma verdadeira revolução axiológica, na medida em que defendeu ser os verdadeiros valores não aqueles ligados às coisas exteriores, como o poder, a fama, a riqueza e muito menos aqueles referentes ao corpo como a vida, a beleza, o vigor, a saúde física, mas sim os valores da psique/alma, que em última instância, reduzem-se ao conhecimento. Os valores atribuídos às coisas exteriores e ao corpo, quando dissociados do conhecimento, tornam-se grandes males. Nesse sentido, é compreensivo a ênfase dada à máxima: “conhece-te a ti mesmo”, pois a ausência desse conhecimento leva ao erro, ou seja, o erro é proveniente da ignorância, do desconhecimento. Percebe-se, portanto, que há identidade entre verdade e bondade, entre o ser, o conhecer e o agir. Pode-se questionar tal entendimento a partir da observação cotidiana, repleta de situações nas quais as pessoas, sabendo o que é certo a ser feito, fazem o que sabem ser errado. Mas não há aí uma interpretação superficial da questão? Conhece-te a ti mesmo não se reduz ao encontro racional com suas emoções e reações, mas um mergulho naquilo que é a constituição fundamental do ser humano: o verdadeiro ser humano é fundamentalmente bom, por isso a necessidade de um conhecimento verdadeiro de si mesmo.
No conhece-te a ti mesmo na há receita de felicidade, mas uma exortação a se por a caminho de si mesmo.

REFERÊNCIAS

ARISTÓTELES. Ética à Nicômaco. São Paulo: Martin Claret, 2002,
REALE, Giovanni & ANTISERI, Dario. História da Filosofia, Vol. I 7ª ed.. São Paulo: Paulus, 2005;
DAINEZI, Gustavo. Conhece-te a ti mesmo. In: Filosofia: ciência e vida, ano VI, nº 71, junho; 2012, pp. 14-22.
PLATÃO Apologia de Sócrates. São Paulo: Nova Cultural, 1999.p. 52. Col. Os Pensadores.



[1] Cf. REALE & ANTISERI, p. 87
[2] DAINEZI, G. p. 18.

quinta-feira, 10 de abril de 2014

LIBERDADE OU SEGURANÇA?


Apresentando Alexis de Tocqueville
Em que contexto recusar a liberdade torna-se uma alternativa? Para responder a essa pergunta convidamos o pensador francês Alexis de Tocqueville (1805-1859), filósofo, político, historiador e escritor francês que se tornou conhecido por suas análises da Revolução Francesa (1789), da democracia americana e do desenvolvimento das democracias ocidentais. Suas principais obras são: A democracia na America (1835), O Antigo Regime e a revolução (1854) e Lembranças de 1848 (1893 – publicação póstuma).

Quando a liberdade é ameaçada
Tocqueville acompanhou de perto os efeitos da Revolução Francesa, que em 1789 pôs fim ao regime monárquico e inaugurou a República na França. O documento mais importante desse movimento histórico foi a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, conhecido como o certificado de nascimento da democracia moderna. Seu primeiro artigo correu o mundo: “os homens nascem e permanecem livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem basear-se no bem comum”.
O que mais impressionou Tocqueville em relação à Revolução francesa foi a violência com que ela se deu. Por que uma revolução que defendia a liberdade, a igualdade e a fraternidade levou ao Terror?[1] Lutar pelo ideal de igualdade pode levar à violência? O desejo de liberdade pode resultar no seu contrário? Em que condições a luta pela liberdade e a igualdade leva à violência ou à tirania? Por que é tão difícil garantir a liberdade? O que fazer para preservá-la? O que vale mais, a liberdade ou a igualdade? Combinar os ideais de igualdade e liberdade transformou-se na obsessão de Tocqueville, presente em todos os livros, e ficou conhecida como “dilema tocquevilliano”.

O Novo Mundo e o sonho da liberdade
Os temas da liberdade e da igualdade entre os homens e mulheres levaram Tocqueville a fazer uma Viagem aos Estados Unidos, que se tornara independente em 1776, treze anos antes da Revolução Francesa e tinham também como bandeira a democracia, liberdade e a igualdade. E mais: parecia que eles tinham encontrado a fórmula de associar igualdade de condições com liberdade de ação e expressão.
A decisão de Tocqueville de visitar os Estados Unidos objetivava conhecer as prisões, pois era famosa a experiência de democracia, direitos civis e liberdade.
Tocqueville registrou, em detalhes, os aspectos da vida no país: como os professavam suas crenças religiosas; escolhiam seus representantes; defendiam seus interesses em associações; organizavam a vida cotidiana; o gosto ou indiferença frente à arte; portavam-se diante da comida, como eram educados; em que eram rudes... A democracia dos Estados Unidos da América era única no mundo. Tocqueville buscava a fórmula daquele sucesso, a saber: como é possível organizar uma sociedade em que a maioria pode participar e decidir sobre seu destino?
Para Tocqueville, a sociedade americana nasceu sob o sinal da liberdade. Os colonos “puritanos” vindos da Inglaterra fugiam da repressão religiosa e desejavam governar a si próprios. Assim, a liberdade de crença sempre fez parte da história que eles queriam contar para si e para o mundo, afirmando o seu amor pela liberdade. Ademais, a sociedade americana, desejando governar a si própria, desenvolveu o individualismo como ideal e como prática de vida.
Tocqueville, porém, alerta: eleições livres não garantem bons governantes, pois é falsa a equivalência entre direito de voto e a real liberdade. A manutenção da liberdade exige atenção redobrada. Um dos mais importantes elementos democráticos é a imprensa livre, pois ela tem a função de impedir o avanço de atos condenáveis quando os divulga e chama atenção do público para eles.
Tão importante quanto obter a democracia é cuidar diariamente para que ela possa funcionar em benefício da sociedade. Por isso, Tocqueville valoriza o conhecimento dos hábitos e costumes de uma sociedade: aquele que se aprende a gostar, o que se ensina a observar, o que se proíbe, o que se toma como direção de vida. Se as democracias partem de pontos comuns – a liberdade de escolha dos representantes pelos representados, a liberdade de imprensa, opinião e crença – as diferenças entre as sociedades geram diferenças entre as formas que elas encontram de vivenciar o que entendem por democracia.

O Velho Mundo e suas contradições
A França revolucionária foi tema do livro O Antigo Regime e a revolução (1854), nele Tocqueville procurou mostrar o que existia na França pré-revolucionária para que a revolução tivesse o resultado que teve. Procurou os elementos que facilitaram a perda da liberdade e a centralização do governo até o clímax do Terror. Buscou nos costumes, hábitos, vícios e maneiras de ser dos franceses traços e características que o ajudassem a entender por que a tirania se instalou no período pós-revolucionário.
A ideia de democracia tinha vindo para ficar. Não era mais possível defender que os homens eram desiguais por nascimento e a sociedade assim deveria permanecer com alguns dotados de privilégios por toda a vida e outros condenados a nãoparticpar dos benefícios econômicos, sociais e políticos.
Os ideais de igualdade tinham vindo para sempre e era justo e desejável, mas cada sociedade os havia abrigado ou os abrigaria à sua maneira. Para Tocqueville, a França não havia adotado a melhor forma, por que, para garantir a igualdade, estava sacrificando a liberdade. (BOMENY, H. & FREIRE-MEDEIROS, B.(org.). Tempos modernos, tempos de sociologia. São Paulo: Editora do Brasil, 2010, pp. 72-76[texto adaptado e resumido para a sala de aula]).



[1] O Terror foi a etapa mais violenta da Revolução Francesa. Durou de 05 de setembro de 1793 a 27 de julho de 1794 e foi instituído pelos revolucionários jacobinos, liderados por Robespierre, e foi marcado por uma repressão sistemática e brutal contra aqueles que fossem considerados inimigos da Revolução. Muitos foram condenados à guilhotina pelo tribunal revolucionário. Estima-se que entre 16.500 e 40 mil pessoas tenham sido mortas.

domingo, 23 de março de 2014

TERNURA, UM JEITO ELOQUENTE DE FALAR DE AMOR


Epitácio Rodrigues 

Cada um dos nossos sentimentos tem sua linguagem particular e ganha visibilidade através do nosso corpo: nas mãos que se acariciam, nos lábios que se tocam ou tocam a face da pessoa amada, no olhar que busca outro olhar. A respeito dos olhares, vale dizer que, se muito rapidamente aceitamos ser o essencial invisível, não devemos esquecer que nos olhos pode está também a inteligibilidade do essencial. Eles têm o dom de comunicar o nosso interior, “são a janela da alma”. A visão, sem dúvida, é um dos sentidos mais expressivos do nosso corpo, como atesta a nossa crença comum: “seus olhos não me enganam” ou “está escrito nos seus olhos”, ou ainda “longe dos olhos, longe do coração”, “o que os olhos não vêem, o coração não sente”. Estar sob o olhar de alguém pode significar tanto um aprisionamento quanto uma forma de proteção.
Mas de todos os sentimentos, a ternura é o que mais se destaca pela sua comunicação ou visibilidade profundamente centrada no olhar. Podemos dizer que a ternura é um bem-querer que se manifesta num modo peculiar de se olhar. É claro que nem todo modo de olhar comunica a ternura. A agressividade também pode ser expressa na forma como olhamos para alguém ou vice-versa. Ambos são comunicações oftálmicas, porém, como já disse, o jeito do olhar revela o diferencial: um repele, o outro acolhe, um agride, o outro cura, um gera o medo, o outro a segurança.
A experiência da ternura é o lampejo de um olhar que revela um amor que ama por amar. Este amor benevolente é ricamente manifesto no gesto maternal ao acolher contemplativamente o filho(a) no colo. Se nos fosse possível observar o mundo sob uma empatia pueril; ver as pessoas como as crianças vêem, perceberíamos o quanto um adulto pode ser um gigante aterrador nas suas vidas. Porém, é o modo como elas são olhadas suscita o sentimento de segurança: “existe um colo que me aconchega e um olhar que me acolhe”.
Mas não são só as crianças que têm esse privilégio de experimentar a ternura, pois ela está muito presente entre os jovens e adultos. Trata-se de um jeito meigo, aliás, o termo meigo retrata bem a dinâmica da ternura (meigo em português, dizem os especialistas em etimologia, é uma abreviatura da palavra mágico). Assim, este modo de olhar é mágico na medida em que nos envolve numa relação de fascínio, encanto e sedução. É um diálogo silencioso e sereno estabelecido entre duas pessoas que se sentem imersas numa teia de linguagem não-verbal, seja paralela, seja pré-linguística, na qual nenhuma fala explicitamente e ambas se entendem.
Em resumo podemos dizer que a ternura é um jeito meigo ou mágico de olhar que manifesta uma profunda empatia, desencadeando um diálogo não-verbal numa relação de sedução, mistério e revelação: um modo de olhar que se expõe silenciosamente e interroga sobre a resposta do outro.



sábado, 8 de março de 2014

ELAS SÓ QUERIAM CIDADANIA NO SENTIDO PLENO

Epitácio Rodrigues[1]

Todos os anos, desde 1975, o mundo comemora o "Dia internacional da Mulher". A forma mais comum de celebração desse dia é a distribuição de flores, presentes e congêneres. Acredito que as mulheres, de fato e de direito, merecem receber homenagens, dada a sua importância e, sobretudo, à sua dignidade: a mulher é um ser humano e, por isso, nunca deve ser tratada como meio, mas como um ser que tem um fim em si mesmo. Algo, aliás, que já declarava o filósofo Kant a respeito de toda pessoa. Mas já que a pauta é a comemoração, acredito ser oportuno lembrar que com-memorar é "fazer uma memória coletiva", isto é, reportar-se a uma situação ou fato de forma coletiva ou social. Mas, a que nos reporta o Dia Internacional da Mulher? Para onde essa memória nos leva? Quais as mulheres que estão na origem dessa comemoração? Essas questões não podem cair no esquecimento, pois esquecer é não ter a memória de algo e sem isso não há comemoração.
No dia internacional da mulher, o que não pode ser esquecido? Penso que antes de ressaltarmos a dimensão estética (algo importante e que não deve ser negligenciado), devemos recordar que naquele dia, 08 de março de 1857, naquela fábrica de Nova Iorque, as mulheres que a ocuparam eram mulheres trabalhadoras, que numa jornada laboral de dezesseis horas diárias, não dispunham de tempo para viver outras dimensões fundamentais da existência humana. Mas, mesmo nessa situação desumana, foram capazes de perceber a sua condição de exploradas, ideologicamente justificada com base em questões de gênero: ganhar um terço do salário de um homem, simplesmente por ser mulher (um ser inferior?).
As mulheres que estão na origem dessa comemoração eram pessoas pobres, mas que possuíam um rico senso ético, pois ao lado de questões econômicas como equiparação salarial e redução de jornada diária de trabalho, também reivindicavam respeito, tratamento digno por parte dos colegas de trabalho e dos seus empregadores.
Penso que o Dia Internacional da Mulher deve ser a expressão da alegria e da esperança feminina em dias melhores, pois as mulheres merecem isso. Todavia, esse dia nunca pode promover o esquecimento dessa consciência feminina de cidadania, que está na sua origem e que ilustra o seu protagonismo em movimentos sociais, como greve, ocupação do espaço de trabalho com o intuito de provocar um diálogo e uma negociação necessária à vivência de uma experiência laboral mais condizente com a dignidade humana. Aquelas mulheres, cientes da sua luta de classes - patrão versus empregado - e dos conflitos de gênero, eram vozes proletárias femininas querendo promover o diálogo sobre seus direitos civis, políticos, sociais e éticos. A resposta dada ao movimento reinvidicatório provocado por aquelas mulheres foi a violência e a carbonização de aproximadamente 130 vozes. A situação fica pior quando percebemos que as organizações políticas mundiais levaram 118 anos (Um século e quase duas décadas), para reconhecer que elas estavam certas. Por isso, o dia 08 de março é a ocasião para celebrar - tornar célebre a dignidade da mulher, mas também para reafirmar o seu compromisso com a teimosia cívica, reivindicadora dos direitos civis, políticos e sociais que lhe são cotidianamente negados.





[1] Texto originariamente escrito para o blog avozdosprofessores.blogspot.com 

sábado, 18 de janeiro de 2014

AS PORTAS DO TEMPO NOS MUROS DA VIDA

SINOPSE

O livro As Portas do Tempo nos Muros da Vida escrito por Elieldo Carvalho e Epitácio Rodrigues reúne um conjunto de Crônicas e Poesias.
As crônicas assinadas por Epitácio Rodrigues, professor de Filosofia, estão recheadas de provocações filosóficas de influência existencialista e personalista. As poesias de autoria de Elieldo Carvalho Duarte, professor de Língua Portuguesa, deixam transparecer toda a sensibilidade e agudeza de percepção da realidade pelo autor.
A obra possui uma formação que lhe dá leveza e torna sua leitura agradável e convidativa. A temática abordada, apesar de se tratar de gêneros diferentes - crônica e poesia - e lentes diferentes – um olhar condicionado pela formação literária e outro pela formação filosófica - há uma grande convergência entre os temas, de tal forma que se pode dizer que se trata das mesmas questões existenciais cotidianas (o nosso ser no tempo, a liberdade, as escolhas, a solidão, as presenças, o amor...), porém, abordados sob óticas diferentes e ainda assim convergindo para uma unidade              
                                                                                                                                                                       Maria do Carmo Feitosa




Autores: Epitácio Rodrigues
         Elieldo Carvalho Duarte
Características: 
Formato: 15 x 21 cm
Edição: 1ª edição, 11/2013
Nº de paginas: 66p.;
ISBN: 788562718250
Editora: BSG - Juazeiro do Norte-CE


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