sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

A ARTE DE CONSOLAR

Epitácio Rodrigues da Silva

“Ouviu-se uma voz em Ramá, choro e grande lamentação”:
Raquel chora seus filhos e não quer consolação,
Porque eles já não existem” (Mt 2,18).

O sofrimento, enquanto dor na alma, é algo do qual o ser humano não consegue se furtar, uma vez que viver é também está sujeito às doenças, desilusões, crises existenciais, revoltas e uma infinidade de situações que podem ou não ter origem em uma dor física, mas que se manifestam como um abalo psíquico e emocional que, dependendo da intensidade, impossibilitam o individuo de fazer uma avaliação objetiva da situação e até mesmo de retomar as rédeas da sua vida cotidiana por um certo intervalo de tempo. Mas o sofrimento tende a ser transitório na sua duração e diminuído na sua intensidade, não sendo a última palavra no vocabulário existência de um ser humano: se é verdade que não podermos viver sem experimentar algum tipo de sofrimento, não é verdade também que viver e sofrer não se equivalem: ele tende a diminuir de intensidade e passar com o tempo.
Isso não significa que esperar seja a única opção. Pois, o ser humano carrega a crença otimista de que pode intervir, seja na intensidade, seja na abreviação do sofrimento das pessoas que padecem de algum tipo de dor na alma. A dor do outro frequentemente tem o poder de intimar o ser humano a sair da indiferença, despertando-lhe um sentimento de solidariedade, na maioria das vezes, revestida sob a forma de consolo: ação de ir ao encontro de quem sofre com palavras que se propõem auxiliar no alívio da sua dor.
A arte de consolar carrega uma pretensão humilde. Quem consola sabe que não irá extinguir a dor, mas apenas a atenuá-la. Essa consciência, ao que tudo indica, existe desde as sociedades mais antigas. Os gregos, por exemplo, para descrever a ação de consolar, usavam a palavra paramytheomai, que significa: “falar de modo positivo e benevolente para uma pessoa; aliviar, encorajar, exortar, dirigir palavras de ânimo”. Essa palavra foi criada juntando os termos para - perto de, junto de; e mytheomai (verbo derivado de mythos - conversa, diálogo, conselho...) que indica a ação de falar, conversar. Para eles, portanto, era claro o entendimento de que consolar é colocar-se junto de alguém que sofre e dirigir-lhes palavras de ânimo, encorajamento e de alívio da sua dor.
Mas a maior dificuldade das pessoas diante de alguém que sofre é justamente saber o que lhe dizer. Quais palavras que, uma vez pronunciadas, atenuarão a sua dor? Muita gente deixa de visitar uma pessoa querida quando ela está enferma ou perdeu um ente querido por acreditar não saber o que dizer diante do seu sofrimento. Realmente palavras vazias não realizarão a função do consolo. Lembro-me uma vez num velório numa comunidade pequena de zona rural que uma senhora havia perdido o filho num acidente trágico e chorava desoladamente. Um senhor aproximou-se dela e disse: “não chore não, morreu acabou!” ao ouvir essas palavras, ela esbravejou umas três vezes seguidas: “acabou não! A intenção daquele homem do campo era boa, mas a crença daquela piedosa senhora entrava em choque com aquelas palavras. Por isso, é fundamental saber quem é a pessoa, quais suas crenças, sua visão da vida e seus valores mais fundamentais. Porém, quando não se conhece a pessoa o suficiente, vale lembrar que o diálogo, plataforma do consolo, é um movimento de fala e escuta. Se não sabe o que dizer, não diga nada. Mas sempre escute o sofrimento do outro. Tenho visto situações em que as pessoas se ocupam tanto em falar coisas e não são capazes de ouvir o sofrimento do outro. Estar presente é uma forma de falar de sua solidariedade; um jeito de dizer que se importa com a pessoa. Pois, o maior problema diante do sofrimento de alguém não é o silêncio, mas a indiferença.
O consolo é um modo de solidariedade, no qual alguém, diante do sofrimento de outrem, se propõe restabelecer-lhe o chão da existência, mediante uma palavra encorajadora ou de alívio de uma dor. Mas o mais fundamental é que fazendo isso, ela mostra que se importa com a dor daquela pessoa e espera de encontrar alguma palavra que lhe ajude a se reanimar e encarar com mais serenidade o sofrimento que lhe é inevitável.


Ensaio SOBRE A OPINIÃO

“Ah, como uma cabeça banal se parece com outra! Elas realmente foram todas moldadas na mesma forma! A cada uma delas ocorre a mesma ide...